“Eu sou um romântico. Um pierrô do Méier. Sou um homem que acredita no amor eterno […]. Sou um homem que chora. […] A minha sensibilidade, o meu sentimentalismo, chega a ser ridículo.”  (Nelson Rodrigues)

Conhecido por seu estilo provocador e polêmico, Nelson Rodrigues se dizia um romântico. Apostando nesse lado pouco visitado da personalidade do escritor, Pierrô do Méier é uma adaptação teatral inédita de três crônicas da série “A vida como ela é…”: “A troca”, “O monstro” e “Flor de laranjeira”. O monólogo, com atuação de Paulo Trajano e direção de Elena Gaissionok, estreou em março, no Rio de Janeiro (Espaço ABU), onde ficou em cartaz por 11 semanas, e retorna agora aos palcos cariocas para uma breve temporada.

A receptividade da crítica e do público validou Pierrô do Méier como um espetáculo potente, crítico e cheio de humor. Como atesta Tânia Brandão, “[…] trata-se de um espetáculo libertador, daqueles que sacodem as agruras da alma e dizem para seu cérebro: vai, filho de Deus, bandido ou mocinho, vá! […] O tema subterrâneo é […] a libertação do drama do pecado de existir. O espetáculo foi batizado sugestivamente como Pierrô do Méier, uma alquimia de textos de três crônicas […] irreverentes, ácidas, profundamente humoradas e belamente críticas”.

A concepção de Pierrô do Méier se baseou na técnica russa “fala cênica”, reconhecida internacionalmente, que se caracteriza pelo rigor no trato com a palavra encenada. Paulo Trajano é um dos raros artistas no Brasil que adotam esse método e, no comentário de Tânia Brandão sobre o trabalho do ator em Pierrô do Méier, percebe-se a aplicabilidade da técnica: “[…] Paulo Trajano consegue fazer o texto rodrigueano existir. Marionete do mundo, marionete de si, o ator impressiona por sua intensa capacidade expressiva, o poder arrebatador de revelar fisicamente um complexo rol de sentimentos, apoiado em recursos mínimos de cenarização e de definição de figurino. […] Há uma forma de corporificar o texto simplesmente magistral”.

Pierrô do Méier aborda questões retratadas por Nelson Rodrigues nos anos 50 que continuam em evidência nos dias de hoje, tais como a pretensa superioridade do sexo masculino, a desvalorização do desejo feminino, a violência contra a mulher e a criminalização do aborto. As três crônicas têm um fio narrativo único, praticamente sem intervenções sonoras, em uma encenação camerística com poucos elementos cênicos. Nas palavras da pesquisadora Carmem Gadelha, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, “o espetáculo cria a sensação no espectador de olhar pelo buraco da fechadura, mas é também exuberante e transborda em teatralidade”.

O espaço intimista do Teatro Rogério Cardoso da Casa de Cultura Laura Alvim será um atrativo a mais para Pierrô do Méier reforçar a proximidade entre ator e plateia, essencial à valorização da fala cênica e da atmosfera rodrigueana.

Ficha Técnica
autor: Nelson Rodrigues
direção: Elena Gaissionok
atuação: Paulo Trajano
cenografia e figurino: Elena Gaissionok e Paulo Trajano
iluminação: Thales Paradela
programação visual: Aline Assumpção
fotografia: Renato Neto
produção executiva: Cláudio Calixto

A  Casa de Cultura Laura Alvim – Teatro Rogério Cardoso fica na Av. Vieira Souto 176, Ipanema. Temporada de 11 a 26 de outubro.